A demência é uma síndrome progressiva que afeta milhões de pessoas no mundo, sendo caracterizada por um declínio nas funções cognitivas, como memória, raciocínio e linguagem. Mas, os primeiros sinais dessa condição vão além das tão faladas falhas de memória.
O neurologista Maciel Pontes, do Hospital de Base do Distrito Federal (HBDF) aponta que, geralmente, os sinais precoces de demência mais notados são associados às alterações cognitivas, aos problemas de linguagem, à desorientação e dificuldade em realizar tarefas mais complexas. Segundo ele, no entanto, há cada vez mais evidências de outras alterações que podem ser indicar precocemente a condição.
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“Estudos indicam que mudanças no andar, como passos mais curtos, ritmo mais lento e alteração no balanço dos braços, podem ser consequência de dificuldades na comunicação entre o cérebro e o sistema motor. A piora no senso de direção, por exemplo, está frequentemente associada a déficits cognitivos iniciais, como comprometimento da memória espacial”, explica o especialista.
Além disso, existe uma condição específica que associa alterações motoras a sintomas cognitivos iniciais. “Há uma condição chamada síndrome de risco motor cognitivo, que combina queixas de perda de memória com lentidão ao caminhar. Quando esses dois sinais aparecem juntos, o risco de demência cresce de forma considerável”, indica o neurocirurgião Renato Campos, que também atende em Brasília.
Os sintomas também podem variar conforme o tipo de demência. “Demências como a de corpos de Lewy estão intimamente ligadas a problemas motores, como instabilidade postural, quedas frequentes e lentidão dos movimentos. Além disso, existe a hidrocefalia de pressão normal, uma condição que, embora menos conhecida, pode ser reversível se tratada adequadamente”, ressalta Campos.
Do ponto de vista neurológico, essas mudanças estão ligadas à degeneração de áreas do cérebro responsáveis pela coordenação e o controle motor. “Demências como o Alzheimer afetam o lobo frontal, crucial para a tomada de decisões e o controle motor. A perda de sinapses e a morte neuronal prejudicam a integração entre movimento e função cerebral, resultando nessas alterações motoras”, explica Pontes.
Outros sinais precoces que podem sugerir demência
Além das mudanças no andar, outros sinais como dificuldades em realizar tarefas cotidianas, lapsos de memória que afetam atividades diárias e alterações de humor ou comportamento são comuns. “Esses sintomas costumam se manifestar de forma sutil, mas podem evoluir gradativamente”, destaca o neurologista Maciel Pontes.
O especialista também alerta que algumas condições podem estar relacionadas às alterações no andar, como o Parkinson e a hipertensão intracraniana benigna. Essa última apresenta três sintomas principais: dificuldade para caminhar, incontinência urinária e perda cognitiva. “O diagnóstico é feito por meio de exames como tomografia e punção lombar, que avaliam a pressão do líquor”, explica.
Do ponto de vista motor, o neurocirurgião Renato Campos ressalta a importância de observar a lentidão nos movimentos, conhecida como bradicinesia. “É quando o paciente passa a fazer certas atividades com mais vagar”, esclarece.
Outro ponto de atenção é a instabilidade postural, que pode causar quedas frequentes. “Esses quadros de desequilíbrio sem causa aparente devem ser valorizados, especialmente em idosos, pois são sinais precoces de processos demenciais”, afirma Campos.
De acordo com Pontes, os sintomas podem aparecer anos antes de um diagnóstico formal, dependendo do tipo de demência. “Pesquisas sugerem que alterações motoras podem ser percebidas até uma década antes. Ao notar esses sinais, é importante buscar avaliação médica para a realização de exames cognitivos e de imagem. Um diagnóstico precoce permite intervenções que podem melhorar a qualidade de vida do paciente”, recomenda.
Medidas importantes para evitar demência ou reduzir seus impactos
Embora não seja possível evitar completamente as alterações motoras relacionadas à demência ou a outras condições neurológicas, algumas medidas podem ajudar a adiar ou reduzir seus impactos, além de melhorar a qualidade de vida dos pacientes.
De acordo com o clínico geral e geriatra Natan Chehter, do Hospital Estadual Mário Covas, de São Paulo, é essencial manter um acompanhamento médico adequado para identificar a causa exata das alterações motoras. “Se estamos falando de Parkinson, paralisia supranuclear progressiva, demência por corpos de Lewy ou outra condição, o diagnóstico correto e o tratamento adequado são fundamentais”, explica.
Chehter destaca a fisioterapia e fortalecimento muscular são frequentemente recomendados para preservar a saúde muscular e articular. “Isso é válido não apenas para pacientes com doenças neurológicas, mas para todos. Ter um bom condicionamento físico e massa muscular preservada contribui para uma melhor qualidade de vida, independentemente da condição”, afirma.
Já o neurologista Maciel Pontes aponta que uma abordagem multidisciplinar pode fazer a diferença:
- Prática regular de exercícios físicos: ajuda a manter a mobilidade e o equilíbrio;
- Estímulo ao cérebro: atividades como leitura, jogos de raciocínio e aprender algo novo fortalecem as conexões neurais;
- Dieta equilibrada: uma alimentação saudável é essencial para a saúde geral e neurológica;
- Controle de fatores de risco: evitar sedentarismo e o consumo de álcool, controlar hipertensão e diabetes, e monitorar os níveis de vitamina B12;
- Programas de fisioterapia: exercícios específicos ajudam a preservar a mobilidade e a retardar os impactos das alterações motoras.