Minha trajetória foram sucessões de avalanches de situações que eu não consigo entender o porquê e, a essa altura, não faz muita diferença também
— Thais Nogueira, cirurgiã dentista
A infecção generalizada e a perda da mão esquerda
Nogueira estava em casa quando começou a se sentir indisposta e dormiu. Ao acordar, sua mãe percebeu que a filha estava com febre alta e confusa. A cirurgiã dentista deu entrada no hospital com quadro de sepse devido a infecção urinária.
“Eles notaram que meus rins não estavam funcionando e me levaram para o centro cirúrgico, onde tive dois choques. Tive um acesso no braço esquerdo, que causou a oclusão da artéria radial. Ao longo dos dias, a mão esquerda necrosou por falta de oxigenação”, detalha.
A urologista Mariana Toda, do Hospital Santa Paula, explica que a infecção urinária costuma piorar rapidamente se não se restringe à bexiga, subindo para os rins.
“Quando não se dá atenção aos sintomas de piora como cansaço, abatimento, febre que não responde às medicações, dor intratável, confusão neurológica e o paciente fica sem avaliação e cuidado, a infecção toma rapidamente o organismo. O rim é um grande filtro do corpo, cheio de pequenos vasos que, durante uma infecção, permitem a passagem fácil das bactérias da urina para o sangue, deixando que elas circulem livremente”, explica Toda.
Já a necrose de membros como mãos e pés, quando há uma infecção intensa no corpo, se dá porque o organismo automaticamente protege os órgãos que são vitais para que ele sobreviva, como coração e pulmões.
“Em contrapartida, o organismo reconhece que dedos, mãos e pernas não são indispensáveis à sobrevivência. Consequentemente, os vasos que levam sangue a essas regiões começam a se fechar para garantir que todo o líquido chegue apenas aos órgãos vitais. Conclusão: se não chega sangue às mãos, aos braços e às pernas, eles entram em gangrena, morrem e sofrem a amputação”, esclarece Toda.
Nogueira ficou 67 dias internada na Unidade de Terapia Intensiva, sendo sete em coma, lutando pela vida. Quando acordou, sentia dor no braço e pediu para retirarem a faixa dele porque acreditava que o incômodo era por isso. “Quando vi minha mão, sendo da área da saúde, sabia que, muito provavelmente, ela seria amputada”, lembra.
O médico informou à cirurgiã dentista que ela perderia todo seu braço esquerdo. Desolada, procurou uma segunda opinião médica. Esse outro especialista conseguiu preservar o antebraço de Nogueira.
“Dez dias após perder a mão, perdi a bexiga também e fiquei com uma bolsinha, o que afeta muito a autoestima da mulher. Mas não teve jeito de manter o órgão porque a chance de uma nova infecção urinária era muito grande. Então, segui em frente”, conta.
O recomeço
Após receber alta, a cirurgiã dentista começou a adaptação em casa e, com 15 dias, retornou ao trabalho. Suas amigas abriram uma vaquinha para arrecadar dinheiro para uma mão biônica.
Ao mesmo tempo, Nogueira entrou em contato com uma advogada que entrou com uma ação para que o plano de saúde cobrisse os custos da prótese e a juíza foi a favor da santista.
“A empresa de saúde forneceu a melhor mão biônica que eu poderia ter, com custo de 300 mil reais. Com essa conquista, eu gostaria de mostrar para as pessoas que não é o fim. A vida ainda tem muita coisa boa para nós”, reflete
A cirurgiã dentista ainda não está com a mão biônica, pois está realizando o treinamento necessário para usá-la. Mas a expectativa é alta.
Eu espero, assim que eu pegar minha mão biônica, seguir minha carreira sem grandes dificuldades, inspirar pessoas e viver bem, sem ser olhando pela janela de um hospital, como em 2021
— Thais Nogueira, cirurgiã dentista
O dinheiro arrecadado na vaquinha aberta pelas amigas foi destinado a comprar uma outra prótese de reserva quando a principal for para a manutenção. Nogueira afirma que se negou a usar o valor para qualquer outro objetivo que não fosse o que realmente levou a abertura do arrecadamento.